Tenho certeza de que muito do que irei dizer aqui é óbvio, mas, ao mesmo tempo, assustadoramente triste. O diagnóstico moral da nossa época é péssimo, especialmente no Brasil. Em tempos passados, existiam a imoralidade
e a falta de ética em muitos aspectos, mas há algo que devemos observar.
Na antiguidade, os povos tinham suas respectivas divindades, às quais todos zelavam, fossem quais fossem. Podemos duvidar dos métodos e das crenças dos gregos, romanos e persas. Mas uma coisa é certa: eles seguiam a ética de seu tempo, mesmo que, nos dias atuais, seja considerado errado tudo o que era feito.
Hoje, nossa divindade é o nosso ego! Somos nós mesmos. Somos o puro suco do iluminismo. Somos antropocêntricos.
Alguns acreditam que evoluímos moralmente em relação aos nossos antepassados. Eu discordo! Somos tão incapazes, no sentido moral, que sempre recorremos aos escritos de Platão, Agostinho e Jesus Cristo. Por que será? Porque eles são superiores a nós, e ainda precisamos nos basear neles. E eu não acho isso um erro, acho isso excelente. Aquilo que é bom deve ser preservado.
Estou falando essas coisas porque nos achamos muito mais do que realmente somos. E aí temos o erro de achar que somos autossuficientes e que não precisamos olhar para trás para aprender. Achamos que sabemos tudo, mas, se não fossem os nossos antepassados, nada do que temos e sabemos hoje seria possível.
Dito isso, um dos métodos mais eficazes da antiguidade para ensinar um assunto às pessoas mais simples era a música. Podemos usar como exemplo o livro de Salmos, da Bíblia. Os Salmos são canções da época, nas quais podemos
ver o denso conteúdo teológico que era passado nas músicas.
A ideia era ensinar através da canção. Era muito mais fácil aprender assim, e as pessoas decoravam o ensinamento. E até hoje esse método funciona quando aplicado em diversas áreas. É mais fácil decorar o refrão de uma música ou estudar o assunto?
Sabemos também que a música mexe com nossas emoções.
Quando estamos tocando teclado ou violão e usamos notas “m7” e “7+”, o que temos é uma melodia extremamente triste e melancólica. Mas, quando usamos notas maiores, a música ganha alegria.
Platão já sabia disso. Ele até descreve em “A República” algumas escalas gregas que não poderiam ser tocadas para os anciãos, porque algumas escalas seriam prejudiciais aos pensamentos dos anciãos.
Um exemplo prático e atual é o sertanejo sofrência, onde as notas são extremamente tristes. As pessoas se emocionam quando ouvem, algumas até choram. Mas, quando vemos a letra da música, ela está falando de traição. E a pessoa que está chorando é casada e nunca foi traída, mas ela está lá, chorando rios. Isso porque a música mexe com nossas emoções, independente da letra. As vibrações emitidas dos instrumentos, que se tornam notas em nossos ouvidos, independem da letra.
E, nesse meio todo, ao mesmo tempo, as letras estão nos ensinando, entrando em nosso subconsciente. Como nossas emoções estão fragilizadas pela melodia, as letras entram com mais facilidade. E, ao meu ver, é aí que começa
o problema. As pessoas estão aprendendo e admirando o quê nas músicas atuais?
Vamos ler um refrão de uma música bem famosa no Brasil: “Roça em Mim” – Ana Castela, Zé Felipe e Luan Pereira.
“Roça, roça em mim, roça, roça em mim Tira o chapéu e a bota e me bota gostosin’
Roça, roça em mim, roça, roça em mim
Que hoje tu vira o olho galopando gostosin‘”
A melodia é dançante, alegre e descontraída. Mas e o conteúdo? Vamos fazer um exercício mental? Suponhamos que você chegue no seu amigo e diga: ‘Tira o chapéu e a bota e me bota gostosinho.‘ Ficaria estranho? Por que em uma música não é? Na minha opinião, é porque tem a melodia por trás. Isso muda tudo. Ao mesmo tempo que nos empobrece culturalmente, nos tornamos pessoas vazias nesses momentos.
Se um dos meios mais eficazes de ensinar é a música, nós estamos nos tornando idiotas funcionais!
Fazer música é belo, é uma arte para poucos. Poucos têm o talento da música, de sentir cada nota, de saber mexer nas emoções das pessoas. A pessoa que manipula bem as notas faz a alma das pessoas transcender. E mais do que isso, ensina através da música. O músico precisa ser uma pessoa de virtudes; do contrário, o que ele transmitirá para o povo?
O músico precisa saber tocar as emoções das pessoas, abrir o coração delas. E, nesse momento de elevação das emoções, o músico coloca coisas boas na mente de seus ouvintes. Ele ensina aquilo que é virtuoso, que traz
edificação moral.
As pessoas que estão em exposição e em vantagem para influenciar são o reflexo do sucesso em algo. E, se essas pessoas não são boas o suficiente para transmitir valores bons através de sua arte, teremos a decadência da
sociedade.
*Derek Canarin